segunda-feira, 24 de agosto de 2009

MERCADO RELEVA ALERTA DE ROUBINI SOBRE "DUPLO MERGULHO" DA CRISE

Josué Leonel, jornalista

São Paulo, 24 - Pelo menos nesta segunda-feira, a nova investida pessimista do economista Nouriel Roubini parece não ter tido efeito no mercado. Por falta de visibilidade, não foi. O artigo do economista alertando para o risco crescente de um "duplo mergulho" (double-dip) recessivo da economia americana está no topo do
portal FT.com, do jornal Financial Times, e apareceu com destaque em praticamente todos os demais sites internacionais de economia e finanças. Embora as bolsas tenham perdido gás na parte da tarde, o mercado deu sinais de apostar na continuidade da recuperação da economia internacional, aparentemente sem uma recaída como a preconizada por Roubini. A advertência ficou no ar e não causou estrago hoje, mas poderá ser lembrada caso novos indicadores, especialmente nos EUA, contrariem as previsões mais positivas.

O economista americano que comanda o site RGE Monitor chama a atenção para riscos que, se concretizados, podem levar a uma recidiva da crise. Entre eles, estaria o endividamento dos EUA, que coloca o país mais rico do mundo em uma espécie de beco sem saída. Caso resolva cortar gastos e elevar impostos para atacar o déficit e reduzir a dívida, o governo americano poderá minar o processo de retomada. Por outro
lado, não agir e permitir a continuidade do déficit fiscal em níveis insustentáveis poderia levar o mercado a puxar as taxas de juros, desdobramento que, combinado à alta da inflação, resultaria no temido cenário de estagflação.

Embora os investidores provavelmente não ignorem os riscos citados por Roubini, o fato foi que os dados divulgados hoje nos EUA e na Europa acabaram reforçando os argumentos da ala mais otimista do mercado. Números do Fed de Chicago revelaram que o índice de manufatura do meio-oeste subiu 2,6% em julho, para o nível sazonalmente ajustado de 79,7. Foi o primeiro ganho mensal do índice desde junho de 2008 e o mais
acentuado aumento mensal desde setembro de 2003. As encomendas à indústria da zona do euro, por sua vez, cresceram 3,1% em junho na comparação com maio, o maior aumento desde novembro de 2007.

Os indicadores desta segunda-feira não estão isentos dos devidos contrapontos. No caso do índice do Fed de Chicago, o dado foi muito favorecido por um setor específico, o de veículos. Além disso, o indicador saiu de uma mínima em 16 anos em junho, ou seja, subiu sobre uma base muito baixa. Quanto ao indicador europeu,
deve-se ponderar que o dado ainda registrou queda expressiva, de 26,9%, ante junho do ano passado.

Ainda que as advertências de Roubini venham a se revelar corretas, não necessariamente elas farão efeito sobre os mercados no curto prazo. Vale lembrar que o próprio Roubini transformou-se em celebridade ao prever, ainda em meados de 2006, que os EUA passariam pela mais grave crise desde os anos 30. Contudo, a crise só se agravou e ganhou contornos globais no segundo semestre de 2008. Desta vez, mesmo que o "duplo mergulho" previsto pelo economista americano se confirme, pode ocorrer de o mercado ainda contar com tempo para esticar seus ganhos antes que as previsões do "Dr. Catástrofe" comecem a se materializar.

Especificamente no que diz respeito ao Brasil, há ainda um contraponto positivo. O País foi situado por Roubini entre as economias que estão se recuperando mais rapidamente. O economista dividiu o cenário global em dois grupos, de acordo com a situação frente à crise. No primeiro, formado por EUA, Reino Unido, Espanha e Itália, a recessão não estaria "formalmente encerrada" antes do fim do ano. O Brasil estaria em um segundo grupo, formado por países nos quais a recuperação já teria começado, junto com Austrália, Alemanha, França e Japão, entre os países desenvolvidos; e China, Índia e partes da Ásia e América Latina, entre os emergentes. Talvez não por mera coincidência, bolsas destes países, como a brasileira BM&FBovespa, estão com desempenho muito melhor do que o apontado pelos mercados acionários de Wall Street neste ano.

(Josué Leonel é colaborador da AE e comentarista da Rede Eldorado)

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